Toda mãe é louca

Sai, maluca

Sai, maluca

Quando eu era criança minha mãe só me deixava frequentar a casa de amiguinhas cuja família fosse conhecida, porque existia o risco iminente de eu estreitar os laços de amizade com alguma garota que tivesse um pai tarado, e consequentemente levar as minhas Barbies para brincar ao alcance dele. Eu não ficava feliz com as negativas da minha mãe, mas na época achava que tarado era uma palavra engraçada e usada para falar sobre homens que andavam na rua falando alto e sozinhos, chacoalhando os braços. Só descobri o que realmente é um tarado anos depois, quando já estava na idade de ficar chocada com os pensamentos apocalípticos das mães sobre tudo e todos. Aparentemente, elas vêem tarados, atiradores de elite e palhaços da kombi por toda a parte e por isso nós, os filhos, devemos ficar seguros e trancados dentro de casa.

Mas com o passar dos anos, e já vendo os 30 dobrando a esquina, a gente vai ficando cada dia mais parecida com a mãe, a tia e a avó. Hoje mesmo eu estava xingando o transporte público para desconhecidos no vagão – uma típica atitude de senhora. E seria mesmo improvável que eu passasse ilesa pela idade em que elas – as previsões de catástrofes – arrombam a portinha da nossa cabeça e ali se alojam para todo o sempre. Por isso, aqui estão elas, crescendo e se reproduzindo em mim.

Na ausência de filhos, no entanto, eu canalizo as minhas previsões de catástrofes para mim mesma, meu namorado, minhas amigas, meu apartamento e, é claro, meus gatos. Tenho pesadelos horrorosos com gatos fugindo pela frestinha da janela da clínica veterinária na hora da vacina e gatos morrendo e virando notícia esquecidos dentro do carro.

Imaginar as tragédias que podem acontecer se eu me descuidar dos gatos – e me desesperar com cada possibilidade – pelo menos me deixa feliz com o tamanho da criatividade que vive em mim, porque acho que consigo botar o medo do pai tarado no chinelo:

– Antes de sair penso em deixar a janela aberta, mas fico em pânico ao imaginar os gatos desatando os nózinhos da tela da sala e correndo para a rua no exato momento em que um ônibus vem passando;

– Então fecho as janelas mas me vem uma vontade de chorar quando visualizo os gatos assando e desmaiando no apartamento quente e abafado;

– Quando lavo roupa fico checando a máquina de lavar para garantir que não derrubei nenhum gato entre um lençol e duas fronhas, e agora ele está lá sacodindo e se afogando na água com sabão;

– Se os gatos espatifam algo de madrugada eu primeiro checo se não é um invasor (ou um tarado) quebrando a janela para entrar na minha casa, e depois que descubro que foi só mais um copo – o sexto na última semana – cato todos os caquinhos com medo dos gatos saírem pela casa jogando futebol com um caco de vidro, cortando a cara e as patas;

– Antes de sair conto todos os gatos. Primeiro porque um deles pode estar trancado no armário, o que implica em definhar e morrer antes de eu voltar do trabalho, e depois porque pode ser que algum tenha fugido sem eu perceber, então é melhor descobrir logo e começar as buscas;

– Cada vez que um veterinário receita um xarope expectorante, um vermífugo ou uma vitamina, eu releio a receita 175 vezes para me certificar de que estou dando a quantidade certa, e não matando meu gato com uma superdosagem de Cat Lysin. Eu jamais me perdoaria;

– Quando um gato está dormindo por muito tempo eu cutuco e faço levantar. Pode ser que esteja desmaiado ou muito doente, e eu preciso saber a tempo de levar para a emergência;

– Toda vez que coço a barriga das minhas gatas e sinto uma protuberância começo a apalpar atentamente preocupada com a possibilidade de ser um tumor. Mas – que bom! –  sempre é um peitinho.

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