Para as visitas das mães de gato

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Ah, uma bolsa! Não acredito!

Você se lembra do dia em que seu pai chegou em casa carregando duas enormes caixas de papelão que ocuparam metade da sala e anunciou que ali estava o primeiro computador da família? Você, sua mãe e seus irmãos rodearam ansiosos, enquanto o patriarca levava longos minutos para cuidadosamente desembrulhar a parafernália. O mais novo observou todo o ritual de montar, encaixar e achar o cabo certo para cada buraco com o deslumbramento de quem acaba de ganhar um foguete da Nasa,  e o seu irmão do meio já se aboletou na cadeira roubada da cozinha, e que havia sido promovida a Móvel do Computador, com três disquetes na mão e dizendo que ia instalar o Windows 98 – mas sem fazer ideia do que é isso. Você se fez de blasé segurando uma expressão neutra no rosto, mas enlouquecido com todas as possibilidades de nicknames para entrar no bate-papo do uol. Mas sua mãe, enquanto ia e voltava da cozinha, mandou três vezes seu irmão caçula tirar o dedo do botão “porque vai pifar”.

Quando você visita um amigo que tem gatos, você é a caixa com um computador dentro, os gatos são a sua curiosa e intrigada família. Acho importante esclarecer isso porque pessoas que não estão habituadas à convivência com felinos entram na minha casa cheias de cuidados e preocupações com essas coisas peludas que não param de se mexer.

Meus gatos arranham os sapatos das visitas, sobem no encosto do sofá para cheirar o cabelo delas, entram na bolsa dessas pobres pessoas, encaram-nas fixamente, andam por cima delas.

Enquanto tudo isso acontece eu tento oferecer uma água e encontrar o tom de voz mais convincente para explicar que eles não são trombadinhas sem parecer uma mentirosa.

Mas a verdade é que quando você chega a uma casa cheia de gatos o assunto deles com você não é nada pessoal. Na real, você é só uma grande massa desconhecida que fala, se mexe e cheira de um jeito que eles nunca viram. Então eles ficam ao seu redor observando cada uma das suas esquisitices tentando entender para o que é que você serve. Tentam achar alguns botões em você e até se aventuram a apertá-los, para saber se alguma parte sua acende e pisca. Mexem nas suas coisas porque acham engraçado você carregar essas quinquilharias tipo chave e celular. Por falar em chave, o que é isso que balança e faz barulho pendurado na sua bolsa?

Um dos gatos sempre fica meio de canto, reservado. Prefere não se aproximar porque imagina que algo assim tão esquisito deve ser perigoso. E ele vai ficar de olho em você até que resolva se levantar do sofá – que pertence ao gato – e ir embora. Só por precaução.

Mas os outros, destemidos, vão te fuçar e esmiuçar nos mínimos detalhes e fazer experiências com você. São empiristas, os gatos.

Você, amigo visitante, é aquela novidade no meio da sala que chegou sem avisar, cheio de funcionalidades desconhecidas e botõezinhos que pedem “me aperta”.

Esse estudo de caso com o seu corpo todo e seus dispositivos vai durar uns bons 50 minutos. Talvez até mais se você for uma visita performática que fala, come e dança, o equivalente aos computadores que já vinham com CD de instalação da Aol. Ela vai até você perceber que não adianta relutar, que é preciso aceitar os gatos, com seus pelos na roupa preta e suas unhas finas e pontiagudas na calça jeans.

Mas quando você, visita, começar a achar engraçado sentir aquele bigode fazendo cócegas no braço, e quando te bater uma vontade de ser amiga dos bichanos, seu status de invasor alienígena será passado e você não mais estará no centro da obsessão felina.

Depois que os gatos derrubarem seu guaraná, pisarem nas suas pernas, puxarem seu cabelo, chutarem sua cabeça enquanto correm no encosto do sofá, interromperem sua conversa, te assustarem no banheiro e conseguirem sua atenção, eles vão ficar entediados, deitar e dormir.

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