Gatos amam loucamente

Entre um pãozinho e outroEu sei que o Bilbo me ama porque quando eu chego ele se atira em cima de mim e lambe minha cara até a lente de contato escapar do olho. Sei que meu cachorro me adora porque quando eu não estou em casa ele sai catando meus sapatos, meias e sutiãs, amontoa tudo na cama dele e deita em cima, e se isso não é Transtorno Obsessivo Compulsivo, deve ser saudade. Cachorros têm um jeito tão direto e descontrolado de demonstrar afeto que ninguém fica em dúvida de que ganhou o coração canino.

Já os gatos são finos e elegantes e não curtem todo esse escancaramento emocional. Se os felinos fossem uma Spice Girl seriam Victoria Beckham, sempre discreta e bem vestida.

O problema é que muita gente acha que a Posh Spice é inexpressiva, assim como tem a mesma errônea ideia sobre os gatos. Manter a sobriedade em público não significa ter coração de pedra. Para essa gente que acha que Victoria e os gatos não têm sentimentos, eu recomendo passar uns três dias aqui em casa vendo o que são felinos emotivos, dramáticos e sentimentais.

Amelie esbofeteia quem estiver no colo na hora em que ela resolve mamar. Ela “mama” no braço da gente até hoje e o “chega pra lá” da gata não é exatamente o que podemos chamar de sutil. Se ela quer o colo, senta o tabefe na orelha do gato que entrar no caminho.

Olivia tem quase o mesmo rompante emotivo do Bilbo, a diferença é que ela faz isso quando está a fim, e não toda vez que eu entro em casa. Só que ela gosta de pular no ombro, que nem papagaio, e esfregar as bochechas dela no nosso cabelo. Às vezes ela faz isso com quem mal conhece e assusta as visitas, que sempre acham que é um ataque.

Quando quer carinho, Olivia sobe na prateleira mais alta da cozinha e começa a fazer uma dancinha. Ela empina a bunda, abaixa a cabeça e esfrega as bochechas na prateleira. Toda essa coreografia de dançar na taça no Sabadão Sertanejo é um pedido de cafuné dos mais suplicantes. Mas não adianta puxar a gata da prateleira e pegar no colo, o carinho tem que ser recebido ali no alto, mesmo que para isso seja preciso subir na cadeira. Azar o seu que é baixinho.

Marvin tem um jeito ogro que não dá para resistir. É como se ele tivesse crescido rápido demais e não soubesse que virou um gato enorme. Quando quer cafuné, chega dando cabeçadas e fazendo a gente derrubar o que tem na mão. Depois, deita no colo e dorme tão pesado que, na hora que eu quero fazer xixi, penso se não é mais fácil cortar uma perna fora do que fazer o gato sair de cima de mim.

Já a Mia é tão sossegada e tranquila que o negócio dela é demonstrar amor dormindo de conchinha. E não tem travesseiro mais gostoso. Ela deixa abraçar, botar a cabeça no colo, e dorme de boa a noite toda. Só começa a gritar de manhã cedo, na hora sagrada da comida.

Gatos também demonstram amor amassando pãozinho. Quando o gato sobe em cima de você e começa a te pisotear, entenda: é massagem. E massagem é sinal de amor, porque não conheço ninguém que faça massagem em quem odeia, a menos que ganhe dinheiro para isso.

Se bater uma dúvida sobre as verdadeiras intenções do gato, chegue o ouvido mais perto e procure o barulhinho de motor. Se ele estiver fazendo um “brrrr” é porque está curtindo ficar perto de você. Gatos só ronronam quando estão felizes e relaxados.

Aliás, se o gato estiver encostando em você, já é um bom sinal. Gatos costumam ser reservados com estranhos. Amelie se esconde no fundo do armário, embaixo da pia, e só sai de lá quando a visita vai embora.

Gatos amam pra caramba. Amam loucamente. E demonstram isso à maneira deles. Se você acha que gatos são inexpressivos, vá lá trabalhar essa falta de sensibilidade e depois nós conversamos, ok.

Mãe de gato, mãe de cachorro

Ninho de Mafagafos

Ninho de Mafagafos

Não fosse a mania da Olivia de comer fios para matar o tédio, e a ideia mirabolante de construir uma torre para os gatos se divertirem, tudo continuaria igual.

Mas já na reta final da construção do empreendimento imobiliário felino, um prédio de três andares com cobertura e arranhador, estávamos entre tábuas de madeira lixadas e alguns parafusos do tamanho errado, quando uma bolinha de pelos minúscula apareceu balançando o rabinho de um jeito tão encantadoramente maravilhoso que eu não consegui deixar de agarrar e apertar e apertar e apertar.

Já apaixonados pelo filhote vira-latas da vizinha, eu e o Pai de Gato continuamos a construção do triplex com o cachorrinho enroscado em nossas pernas. Foi só quando ele começou a revirar o lixo insistentemente que eu, intrometida que sempre fui, resolvi procurar a vizinha para elogiar a fofura do cachorro e sutilmente dar aquele toque: “amiga, seu filho tá com fome”.

Descobrimos que o filhote era de uma outra vizinha, cujo filho pegou na rua, mas que não queria o cachorro, não estava cuidando, e daria para quem quisesse levar. Levei.

Não que eu tenha tempo, dinheiro e espaço de sobra. Mas àquela altura do campeonato eu já estava apaixonada demais para deixar aquela coisinha ali.

Infelizmente, abrigos de ONGs vivem na lotação máxima, todo protetor passa sufoco para arcar com as despesas dos animais que resgata, e no Centro de Controle de Zoonoses a fila de espera dos cães por um dono pode durar sete anos. Enquanto isso, filhotinhos de raça são “fabricados” em escala industrial por criadores, vendidos por R$ 3 mil em pet shops e às vezes exportados para outros estados como se não houvesse nenhum outro cachorro ali na primeira esquina querendo um dono. A questão dos animais de estimação no Brasil é esquizofrênica e desesperadora demais para que eu consiga resolver sozinha, mas, movida principalmente pela paixão instantânea pelo filhote, decidi que tentaria impedi-lo de entrar para as estatísticas do descaso.

Se Bilbo Bolseiro não tivesse vindo para a minha casa, talvez nem estivesse vivo hoje. Na primeira semana por aqui, um olhinho inchou e ficou opaco. Podia ser cinomose, mas por sorte a doença é menos grave: ele está com erliquiose, transmitida por um carrapato. Entre outros sintomas, ela causa anemia grave e pode matar.

Mas nosso pequeno hobbit não se deixou abater e deve terminar o tratamento em dez dias. O olhinho está ótimo, ele não perdeu a visão, e não tem mais nenhum sintoma da doença. Palmas pra ele e pra Dra. Tatti da Cobasi.

Em um mês, o novo morador também já construiu uma relação quase estável com os donos da casa. Mia dá longos banhos no filhote, dorme aninhada e faz xixi no tapete dele. Já Marvin tem se revelado um talento do jiu jitsu e passa o dia rolando pelo chão com Bilbo. Os dois até tentam brincar juntos com a bolinha, mas cada um tem as próprias regras para a brincadeira e nenhuma das partes parece disposta a ceder.

É claro que eu também fiquei bem preocupada com a viabilidade de manter um cachorro vivendo em um apartamento que já tem quatro gatos. Eles vão se odiar? Eles vão me odiar?

Poderia acontecer. Mas que bom que tudo fica melhor com o passar do tempo.

Amelie parecia disposta a viver pra sempre dentro de um armário e está nesse momento dormindo no sofá com o cachorro. Os dois separados apenas por uma almofada. Não que eles se amem loucamente, mas também não vivem em pé de guerra. A outra gata, que também não ficou muito feliz com a presença ilustre de Bilbo Bolseiro, ainda sente um pouco de medo, mas já deixa o filhote chegar perto dela. Com o portão baixo que separa a cozinha e a área de serviço do resto da casa, os gatos têm um espaço tranquilo e o cachorro não come a comida que não é dele.

Minha casa também não tá fedendo a xixi e os vizinhos não cogitam chamar a vigilância sanitária. A vizinha do mesmo andar disse que não escuta o Bilbo latir e só percebeu que tem um cachorro morando aqui porque o dela ficou na minha porta.

Pode ter uma pocinha no meio da sala de vez em quando, e ontem mesmo eu pisei em um coco quando entrei. Mas tudo isso é passageiro, filhotes aprendem rápido a usar o tapete higiênico, e limpar xixi e coco do chão de casa leva menos de três minutos. Nunca soube da história de uma mulher que agonizou e morreu de tanto limpar o xixi do cachorro.

Eu não queria um cachorro. Não fiz planos para adotar um e se alguém me perguntasse se eu queria usar minhas poucas horas livres para ensinar um filhote a fazer xixi no lugar certo eu diria na lata um “não, obrigada” sem dúvida alguma. Mas o ser humano é um animal plenamente capaz de lidar com reviravoltas e se adaptar – por isso chegamos até aqui e não morremos nas cavernas. A empresa passa por uma crise quando você está feliz e de boa no seu trabalho, e te faz repensar a vida e procurar outro emprego. O amor da sua vida aparece quando você sai de havaianas e meias para comprar leite no mercadinho, e não quando você se produz para o Oscar e gasta R$ 400 para fazer cabelo e maquiagem. Às vezes o amor da sua vida aparece até quando você está comprometido com alguém. Aí você para, pensa, toma sua decisão e vai ser feliz. Se você abrir o coração, vai viver bem e em paz com a sua escolha.

Então, por mais que esse “filho” não tenha sido planejado, ele traz felicidade, se você escolher ser feliz com ele.

Se você quer um cachorro, ou se você nem queria mas apareceu algum na sua vida e você não sabe se dá conta desse filho, tenha paciência e abra o coração. Crianças passam anos mijando em fraldas, camas, sofás e colos e ninguém as leva para feiras de adoção por causa disso. Em dois anos o cachorro já é um adulto maduro, diferentemente da criança, que aos dois anos de idade está no auge da capacidade de enlouquecer todo mundo. E mesmo assim o ser humano é perseverante e aguenta firme o rebento por umas duas décadas. Tem filho que passa três, quatro décadas ali e nenhum pai (exceto os realmente perturbados) o tranca no banheirinho.

Meus pais não desistiram de mim (e eu mijei na cama muito mais do que uma criança normal), seus pais não desistiram de você, não vejo motivos plausíveis para desistir de um cachorro. Força!

Depois de um mês com o Bilbo em casa, eu sinto que está tudo dando certo quando o vejo abanando o rabo enquanto dorme. Se ele tem sonhos bons, deve ser porque é feliz. Mesmo tendo erliquiose, morando em um apartamento com quatro gatos, passando o dia sem pessoas por perto porque temos que trabalhar. Ele ainda não pode tomar vacinas e por isso não sai para passear, não brinca no parque, não pode ter contato com outros cachorros. Mas nessa nova vida o Bilbo parece ser feliz.

Eu sou interrompida quando estou assistindo Sense8 e quando – SPOILERS! – Cersei Lannister está apanhando na prisão, porque o Bilbo quer brincar naquele fatídico momento e porque ele fez xixi na sala de novo. Tive medo de dar tudo errado e minha vida virar um caos, nunca limpei o chão tantas vezes em tão pouco tempo, e agora mais do que nunca recuso convites para sair porque prefiro ficar em casa com os meus bichos. Mas isso, no meu conceito de felicidade, também é ser feliz. Então eu, que já era mãe de gato, virei mãe de cachorro também.

E os gatos adoraram a torre.

Para as visitas das mães de gato

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Ah, uma bolsa! Não acredito!

Você se lembra do dia em que seu pai chegou em casa carregando duas enormes caixas de papelão que ocuparam metade da sala e anunciou que ali estava o primeiro computador da família? Você, sua mãe e seus irmãos rodearam ansiosos, enquanto o patriarca levava longos minutos para cuidadosamente desembrulhar a parafernália. O mais novo observou todo o ritual de montar, encaixar e achar o cabo certo para cada buraco com o deslumbramento de quem acaba de ganhar um foguete da Nasa,  e o seu irmão do meio já se aboletou na cadeira roubada da cozinha, e que havia sido promovida a Móvel do Computador, com três disquetes na mão e dizendo que ia instalar o Windows 98 – mas sem fazer ideia do que é isso. Você se fez de blasé segurando uma expressão neutra no rosto, mas enlouquecido com todas as possibilidades de nicknames para entrar no bate-papo do uol. Mas sua mãe, enquanto ia e voltava da cozinha, mandou três vezes seu irmão caçula tirar o dedo do botão “porque vai pifar”.

Quando você visita um amigo que tem gatos, você é a caixa com um computador dentro, os gatos são a sua curiosa e intrigada família. Acho importante esclarecer isso porque pessoas que não estão habituadas à convivência com felinos entram na minha casa cheias de cuidados e preocupações com essas coisas peludas que não param de se mexer.

Meus gatos arranham os sapatos das visitas, sobem no encosto do sofá para cheirar o cabelo delas, entram na bolsa dessas pobres pessoas, encaram-nas fixamente, andam por cima delas.

Enquanto tudo isso acontece eu tento oferecer uma água e encontrar o tom de voz mais convincente para explicar que eles não são trombadinhas sem parecer uma mentirosa.

Mas a verdade é que quando você chega a uma casa cheia de gatos o assunto deles com você não é nada pessoal. Na real, você é só uma grande massa desconhecida que fala, se mexe e cheira de um jeito que eles nunca viram. Então eles ficam ao seu redor observando cada uma das suas esquisitices tentando entender para o que é que você serve. Tentam achar alguns botões em você e até se aventuram a apertá-los, para saber se alguma parte sua acende e pisca. Mexem nas suas coisas porque acham engraçado você carregar essas quinquilharias tipo chave e celular. Por falar em chave, o que é isso que balança e faz barulho pendurado na sua bolsa?

Um dos gatos sempre fica meio de canto, reservado. Prefere não se aproximar porque imagina que algo assim tão esquisito deve ser perigoso. E ele vai ficar de olho em você até que resolva se levantar do sofá – que pertence ao gato – e ir embora. Só por precaução.

Mas os outros, destemidos, vão te fuçar e esmiuçar nos mínimos detalhes e fazer experiências com você. São empiristas, os gatos.

Você, amigo visitante, é aquela novidade no meio da sala que chegou sem avisar, cheio de funcionalidades desconhecidas e botõezinhos que pedem “me aperta”.

Esse estudo de caso com o seu corpo todo e seus dispositivos vai durar uns bons 50 minutos. Talvez até mais se você for uma visita performática que fala, come e dança, o equivalente aos computadores que já vinham com CD de instalação da Aol. Ela vai até você perceber que não adianta relutar, que é preciso aceitar os gatos, com seus pelos na roupa preta e suas unhas finas e pontiagudas na calça jeans.

Mas quando você, visita, começar a achar engraçado sentir aquele bigode fazendo cócegas no braço, e quando te bater uma vontade de ser amiga dos bichanos, seu status de invasor alienígena será passado e você não mais estará no centro da obsessão felina.

Depois que os gatos derrubarem seu guaraná, pisarem nas suas pernas, puxarem seu cabelo, chutarem sua cabeça enquanto correm no encosto do sofá, interromperem sua conversa, te assustarem no banheiro e conseguirem sua atenção, eles vão ficar entediados, deitar e dormir.

Toda mãe é louca

Sai, maluca

Sai, maluca

Quando eu era criança minha mãe só me deixava frequentar a casa de amiguinhas cuja família fosse conhecida, porque existia o risco iminente de eu estreitar os laços de amizade com alguma garota que tivesse um pai tarado, e consequentemente levar as minhas Barbies para brincar ao alcance dele. Eu não ficava feliz com as negativas da minha mãe, mas na época achava que tarado era uma palavra engraçada e usada para falar sobre homens que andavam na rua falando alto e sozinhos, chacoalhando os braços. Só descobri o que realmente é um tarado anos depois, quando já estava na idade de ficar chocada com os pensamentos apocalípticos das mães sobre tudo e todos. Aparentemente, elas vêem tarados, atiradores de elite e palhaços da kombi por toda a parte e por isso nós, os filhos, devemos ficar seguros e trancados dentro de casa.

Mas com o passar dos anos, e já vendo os 30 dobrando a esquina, a gente vai ficando cada dia mais parecida com a mãe, a tia e a avó. Hoje mesmo eu estava xingando o transporte público para desconhecidos no vagão – uma típica atitude de senhora. E seria mesmo improvável que eu passasse ilesa pela idade em que elas – as previsões de catástrofes – arrombam a portinha da nossa cabeça e ali se alojam para todo o sempre. Por isso, aqui estão elas, crescendo e se reproduzindo em mim.

Na ausência de filhos, no entanto, eu canalizo as minhas previsões de catástrofes para mim mesma, meu namorado, minhas amigas, meu apartamento e, é claro, meus gatos. Tenho pesadelos horrorosos com gatos fugindo pela frestinha da janela da clínica veterinária na hora da vacina e gatos morrendo e virando notícia esquecidos dentro do carro.

Imaginar as tragédias que podem acontecer se eu me descuidar dos gatos – e me desesperar com cada possibilidade – pelo menos me deixa feliz com o tamanho da criatividade que vive em mim, porque acho que consigo botar o medo do pai tarado no chinelo:

– Antes de sair penso em deixar a janela aberta, mas fico em pânico ao imaginar os gatos desatando os nózinhos da tela da sala e correndo para a rua no exato momento em que um ônibus vem passando;

– Então fecho as janelas mas me vem uma vontade de chorar quando visualizo os gatos assando e desmaiando no apartamento quente e abafado;

– Quando lavo roupa fico checando a máquina de lavar para garantir que não derrubei nenhum gato entre um lençol e duas fronhas, e agora ele está lá sacodindo e se afogando na água com sabão;

– Se os gatos espatifam algo de madrugada eu primeiro checo se não é um invasor (ou um tarado) quebrando a janela para entrar na minha casa, e depois que descubro que foi só mais um copo – o sexto na última semana – cato todos os caquinhos com medo dos gatos saírem pela casa jogando futebol com um caco de vidro, cortando a cara e as patas;

– Antes de sair conto todos os gatos. Primeiro porque um deles pode estar trancado no armário, o que implica em definhar e morrer antes de eu voltar do trabalho, e depois porque pode ser que algum tenha fugido sem eu perceber, então é melhor descobrir logo e começar as buscas;

– Cada vez que um veterinário receita um xarope expectorante, um vermífugo ou uma vitamina, eu releio a receita 175 vezes para me certificar de que estou dando a quantidade certa, e não matando meu gato com uma superdosagem de Cat Lysin. Eu jamais me perdoaria;

– Quando um gato está dormindo por muito tempo eu cutuco e faço levantar. Pode ser que esteja desmaiado ou muito doente, e eu preciso saber a tempo de levar para a emergência;

– Toda vez que coço a barriga das minhas gatas e sinto uma protuberância começo a apalpar atentamente preocupada com a possibilidade de ser um tumor. Mas – que bom! –  sempre é um peitinho.

Quem cuida do gato quando o dono viaja?

Minha última viagem longa foi no Carnaval. O destino era distante e eu sequer teria como voltar correndo para casa se acontecesse uma emergência. Portanto, eu só conseguiria aproveitar a minha viagem sem culpa nem desespero se alguém de confiança se responsabilizasse pelos cuidados básicos com as meninas.

Esse foi, então, o meu primeiro contato com o trabalho de cat sitter, vulgo babá de gato. A amiga de uma amiga ficou com a chave da minha casa e visitou Mia, Olivia e Amelie durante os dias de folia para dar comida e água, limpar a caixa de areia e brincar um pouquinho com elas. Para que eu me certificasse de que tudo estava bem, todas as visitas foram encerradas com fotos e relato via e-mail.

Vendo meu trio de mocinhas feliz e tranquilo eu pude curtir minha viagem em paz, apesar da saudade e da estranha sensação de ter as pernas livres durante toda a noite. E sei que essa foi a melhor decisão para elas, já que tirar as três de casa e deixar em um hotel causaria estresse e estranhamento, especialmente na Amelie, que é encantadoramente rabugenta.

Passado o Carnaval, a Páscoa, o Corpus Christi, o Dia dos Pais e as duas crises respiratórias da Olivia, que transformaram o Hospital Veterinário num lugar recorrente à minha vida social, veio a ideia. Eu também posso cuidar de todos os gatinhos do mundo. Posso também amassá-los, esmagá-los, apertá-los, implorar que ronronem, até tomar um tapa na cara e ganhar um arranhão no nariz, que nem quando fui me meter a afofar o gato mais famoso dessa internet e saí com a face desenhada (mas foi uma honra).

Então, se você mora nas quebradas da Zona Leste e seus bichanos vão ficar em casa enquanto você se aventura pelo mundo, eu posso ser a solução para os seus problemas 😉

babapet

Olivia,

 

 

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Dos segundos que a veterinária levou para me dizer, enquanto eu te segurava, que talvez você precisasse ficar ali, dormindo numa gaiolinha para que pessoas que você nunca viu te dessem remédios (e eu sei que você odeia tomar remédios), até aquele momento em que você ficou tão fraca, e tão cansada, que olhava para mim sem levantar a cabeça do travesseiro, eu passei da negação à aceitação e em seguida ao maior de todos os pânicos. Eu xinguei o plantão, o trabalho, a faculdade de jornalismo e o início do inverno. Eu chorei no chuveiro, no metrô, no teclado, no ombro de uma amiga. Eu me culpei por todos os dias e todas as coisas que eu encontrei pela frente e que serviam na culpa.

Tem egoísmo nesse medo da morte, eu sei. Então eu sou egoísta. Mas eu gosto de verdade da minha vida quando você abre a porta do quarto pra roubar meu lugar no travesseiro, quando você come meu cabelo e dá banho nas minhas bochechas como se eu também fosse um gato, e quando você espatifa garrafas pela casa e faz de conta que foi a Mia.

Ver você com a respiração pesada, exausta demais para levantar, trouxe para muito perto a ideia de que um dia eu vou ter que continuar vivendo sem magrela nenhuma para subir no meu ombro e dormir na minha cabeça. Um dia que só deveria chegar daqui a 18 anos, quando eu já tiver aprendido a domar esse egoísmo que me faz querer que você fique aqui comigo. 

Todos os planos que eu fiz para você pareceram prestes a virar só um pedaço da minha imaginação e a varanda, o irmão gato, o pai humano e as crianças que vão disputar com você a devastação das prateleiras estavam quase deixando de ser certezas do seu futuro. 

Mas você me acordou hoje de manhã enchendo minha cara de beijinhos ásperos e me lembrando de que você é a magrela intrusa que apareceu aqui na minha casa tão fraca e doentinha, e passou, e que isso também vai passar. Aí você subiu na mesa, na cadeira e na janela, derrubou as coisas, correu da inalação, e agora eu já sei que só daqui a 18 anos a gente conversa novamente sobre os planos que ainda temos para você.

E não faça mais isso comigo.

Tudo passa, menos mancha de xixi

IMG_20140426_184758 IMG_20140505_211141Não é bem que eu esteja retomando minhas atividades de relatora de peripécias felinas. Às vezes, escrever para pagar as contas faz com que dar um comprimido para o gato seja mais divertido do que continuar escrevendo.

Em paralelo à minha pouca vontade de transformar a vida em texto, no entanto, o trio de mocinhas segue somando 12 quilos de muitos beijos de nariz, unhas afiadas no sofá e lutas incansáveis contra o fecho do pacote de pão de forma.IMG_20140504_094435

Desde a última exposição das meninas na internet, elas aprenderam a conviver com a porquinha da índia, e vice-versa. Manola circula livremente pela casa, sem crises de pânico e ansiedade, enquanto Amélie, Olivia e Mia seguem debatendo o por que dela ser um gato de pernas tão curtas e inabilidade para escalar a estante.

Também aprenderam a conviver com aquele gato barulhento e desgovernado que mora no apartamento da frente, mas gosta de brincar na nossa sala. Pula desengonçado, abana o rabinho e late. Um gato bem esquisito, mas as três disfarçam o constrangimento para não magoar.

Nenhuma delas, agora, é magricela ou caolha. Todas abrem ambos os olhinhos simultaneamente, uma grande vitória para quem chegou carregando coisas de nomes complicados tipo rinotraqueíte. Também ostentam charmosas pancinhas que elevam os números da balança e causam espanto na clínica veterinária.

As mocinhas, agora, adoram a diarista, e importunam a pobre moça o dia inteiro, xeretando tudo o que ela faz. Deve bater uma saudade dos tempos em que as bichinhas do mato se escondiam no fundo do guarda-roupa.

O trio, nessa nova vida, tem mais alguém com quem dividir amor e mastigar cabelo. A gente sabe que não é fácil encontrar gente assim, disposta a explicar a Fórmula 1 de madrugada, dividir o colo e superar a alergia. Mas as três mocinhas conseguem os feitos mais improváveis, e esse é mais um. Já expliquei para elas que gente assim, sempre pronta para passear com a gente no hospital veterinário no meio de uma noite bem gelada, não vende no mercado nem dá sopa pela rua. Tem que ter sorte para encontrar. Mas vai ver ter um corpinho de três cores – ou enormes olhos azuis – é o equivalente felino dos trevos e das figas.

Quando o trio se formou, virando minha casa e todo o resto de cabeça para baixo, não era todo mundo que apostava que a vida ficaria assim, tão legal. Mas olha, não é que a gente conseguiu? Até as disputas a tapas pelas almofadas do sofá ganharam bandeira branca.

Daquela época só sobraram mesmo as manchas de xixi no edredom.

Duas caixas de areia e a minha cama

Fiz xixi na sua cama

Fiz xixi na sua cama

Quando minha primeira gata chegou eu fiquei maravilhada com a função “xixi no lugar certo” que já vem de fábrica. Passei a vida limpando sujeira de cachorro do batente e do pé do sofá e tentando ensinar, sem sucesso, que eu também queria parar e mijar em qualquer lugar quando a vontade apertasse, mas a vida tem regras. Por isso, um ser vivo que já chega sabendo usar o banheiro causa boa impressão.

Mas gatos fazem o que querem, sempre. Dia desses eu deixei a máquina de lavar ligada e saí. Quando voltei, a área de serviço estava alagada e as caixas de areia haviam virado uma ilha no meio daquele mar de espuma e dois dedos de profundidade. Impossibilitadas de chegar às caixas, elas não passaram aperto: fizeram tudo na minha cama.

Quando entrei no quarto, Mia estava enterrando o último xixi no edredon. Em choque, eu apenas murmurei “Por que você fez isso?” e saí transtornada em busca do desinfetante. Ciente de que havia pisado na bola e abalado nosso relacionamento, ela deitou num cantinho e ali ficou, encolhida, me olhando com cara de arrependida.

O que mais me indignou foi a escolha da minha cama como banheiro número 2. Não foi o sofá, não foi a almofada. Foi a minha cama.

Eu, entretanto, não posso culpá-las. Mais inteligentes emocionalmente do que muito adulto que frequenta a terapia, elas foram direto ao ponto para chamar minha atenção, certas de que eu leria o bilhete que explicitamente dizia “hey, você precisa ir lá dar um jeito naquela bagunça que está atrapalhando nossa vida”.

Para que a arte não se repetisse, eu apenas mantive as três fora do meu quarto por uma semana e, claro, não deixei mais a área de serviço alagada por horas. Procurei sugestões no Google e vi gente falando sobre esfregar o focinho do gato no xixi ou fazê-lo deitar no lugar sujo, mas achei cruel. É um gato, não um ser humano adulto. Ele não vai entender por que exatamente você está puto e ainda vai ficar com medo das reações destemperadas do dono.

A raiva foi toda canalizada para a imobiliária, que não me avisou que tinha piscina na área de serviço quando aluguei o apartamento.

Lista de supermercado sem testes em animais

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Faz de conta que tá no Supermarket

Depois da libertação dos beagles e coelhos do Instituto Royal, não faltou gente para dizer que não é possível viver em um mundo que não usa cobaias. Talvez não seja mesmo, sei lá, eu não entendo disso o bastante para argumentar. Mas deve ser possível, pelo menos, minimizar o uso dos animais de laboratório e não desperdiçar vidas com bobagens.

Por isso eu fui ao supermercado munida de uma lista de compras dividida entre marcas decentes e marcas que testam em animais (de acordo com o PETA, Pea e AILA), além de muito tempo disponível, paciência e óculos. Para a minha surpresa, foi possível voltar para casa com tudo que eu precisava e quase nenhum produto fabricado por empresas malvadas.

O primeiro passo – e o mais óbvio – foi anotar tudo o que eu precisava comprar. Dentro de cada ítem, coloquei as marcas que eu poderia escolher e as que eu evitaria, pois testam em animais. Parece simples, mas a Unilever e a P&G, por exemplo, têm mais de uma linha em cada setor, e facilita muito ter algumas listadas para não precisar pegar cada embalagem, virar e procurar, naquelas letrinhas miúdas, qual é o fabricante.

A maior dificuldade foi a falta de informação. Com tantos nomes que não apareceram na lista verde nem na lista negra, fiquei me perguntando “será que esse testa?” em todos os corredores, e cometi alguns erros. Por isso, o projeto de lei que pretende obrigar cada fabricante a especificar na embalagem se faz testes em animais deveria ser retomado. É um direito meu saber a origem do que estou comprando.

LISTA DE COMPRAS

NÃO COMPRAR: Johnson & Johnson, Unilever, Procter & Gamble, Schering Plough, BIC, L’Oreal, Pfizer, Kimberley Clark.

TRANSGÊNICOS (porque não estava difícil o suficiente): Cargil, Bunge, Vigor, Makro, Paladar, Quero, Bristol & Mayers, Melitta, Nutrilatina

– Macarrão

Comprado: Dona Benta, R$ 3,10

– Bolachas

Comprado: Marilac, R$ 3,29

NÃO PODE: Nestlé

– Sucos de caixinha

Comprado: Dafruta, R$ 1,21

NÃO PODE: Nestlé

– Leite

Comprado: Parmalat, R$ 2,98

NÃO PODE: Nestlé

– Granola

Comprado: Natus (podia até ser Kellogg’s, mas não anotei isso e fiquei em dúvida na hora de comprar)

NÃO PODE: Nestlé

– Desodorante

NÃO PODE: Dove, Axe, Garnier – não sei se existe algum desodorante livre de testes. Esqueci de colocar a Garnier na lista inicial e comprei errado.

– Pasta de dente

NÃO PODE: Close Up, Colgate, Sorriso, Aquafresh – também não tinha Aquafresh na lista inicial, comprei achando que não testava e me ferrei. Mas não tinha outra alternativa)

– Sabonete

Comprado: Granado, R$ 2,70

NÃO PODE: Dove, Johnsons, Palmolive, Ivory, Lux, Gessy

– Absorvente

Comprado: Sym (não quero saber se tem cheirinho de margarida, só me importa que não vaze)

NÃO PODE: Always (P&G), Carefree (Johnsons), OB, Sempre Livre, Intimus Gel

– Produtos de limpeza

Comprados: Desinfetante Ypê, R$ 1,99. Sabão em pó Tixan, R$ 4,99 (nunca ouvi falar, seja o que Deus quiser). Álcool Cooperalcool, R$ 7,49

NÃO PODE: Vanish, Veja, Lisol, Poliflor, Comfort, Downy, Ace, Ariel

PODE: Ypê, Tixan, Búfalo, Jet, Bull, Pinho Jet, Soft, Atol

Mandei mal na pasta de dente e no desodorante, mas admito que nesses setores foi bem difícil encontrar alternativas. As próximas tentativas serão mais fáceis, pois já sei quais marcas posso levar e daqui a pouco tô malandra das compras cruelty free. Xampu, condicionador e outros cosméticos eu compro no Boticário, que também não testa em animais.

Todos os preços são do supermercado Sonda Ipiranga, de São Paulo, SP.